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1 - Giacomo e La Befana

Estamos em janeiro de 1874, aos arredores da cidade de Castelguglielmo no Vêneto, Itália. No dia 6 de janeiro, em toda a Itália, comemora-se a Festa dell’Epifania (Festa da Epifania). As crianças estão felizes, pois aguardam ansiosamente os presentes deixados pela Befana, 'La Befana', uma figura imaginária de velha feia, boazinha, mal vestida, que na noite de 5 para 6 de janeiro voa em uma vassoura como as bruxas e leva presentes às crianças descendo pelo duto da chaminé. Ela passeia à noite e leva presentes como laranjas, nozes, pequenos doces caseiros e carvão as crianças. Carvão? sim, o carvão era dado às crianças que foram más ou desobedeceram aos pais durante o ano anterior. 

Giacomo tem apenas dez anos de idade e mora com seus pais no campo. Ele não aprendeu sobre a Befana em livros, pois não sabia ler. Ouviu da boca dos mais velhos na estribaria, anexa a casa, local onde a família se juntava a noite, ao lado dos animais, para fazer o filó. Ali se reuniam os nonos, tios, primos, irmãos e alguns vizinhos para se aquecerem do frio e ouvirem histórias que passavam de geração em geração há centenas de anos. Mas sua mãe, Luigia Munari, não estava presente ao filó da noite de 5 de janeiro. Acontece que no dia 24 de dezembro de 1873, bem na véspera de Natal, nascera Ângela, irmã de Giacomo. Era inverno e foi uma noite tão fria que o seu pai, Giuseppe, só pode registrá-la no dia 28 de dezembro. Luigia estava muito doente e Giuseppe não tinha dinheiro para pagar um médico, por isso todos rezavam terços na esperança de que ela melhorasse.

No dia seguinte, dia 6 de janeiro, Giacomo estava ocupado na estribaria alimentando as vacas e os porcos com feno. Ele raramente brincava com crianças da sua idade, pois mal acabava uma tarefa aparecia outra. Ele não ganhara presentes nem carvão, mas recebeu uma noticia que mudaria sua vida. Luigia Munari, sua mãe não teve forças para lutar a enfermidade e faleceu.  A Befana não foi boa para o menino Giacomo. Teria ele se comportando tão mal ao ponto de merecer um castigo tão terrível? Podemos apenas imaginar quão doloroso e difícil foi esse dia para ele. É bem provável que perdeu também o pai e sua irmã Ângela no espaço de 14 anos entre 1874 e 1888. Foi provavelmente morar com o irmão de seu pai, Carlo Sarti e sua tia Rosa Viaro. Pelo menos agora tinha a companhia do primo Abramo, que tinha então 11 anos de idade. Pode ter ficado em Castelguglielmo ou talvez foi morar em Bagnolo de Po, cidade vizinha onde tinha alguns parentes. Eram camponeses e viviam de forma precária em uma Itália recém-unificada, que passava por uma grave crise econômica e social. O país era densamente habitado e sua população, principalmente a rural, passava fome e muita carência.

Em 1888, com 24 anos de idade, Giacomo emigrou para o Brasil. Estava acompanhado do primo Abramo Sarti, de 25 anos e de sua tia Rosa Viaro, então com 65 anos de idade, viúva de Carlo Sarti. À bordo do navio La France estavam também Maria Sarti, 31 anos, irmã de Abramo, com seu marido Natale Donegá, 32 e o filho de quatro anos (Aristodemo) Mario Donegá com 4 anos de idade. Desembarcaram no porto de Santos no dia 28/06/1888.

Giacomo é meu bisavô paterno. Como descobri esta história? Esta é outra história que vou contar em seguida, em outras postagens. 

Referencias:

1. PAULA, Isabela Reis de. "Curiosità di Natale: La Befana"; Brasil Escola.

2. Blunt, John J. (John James), 1794-1855 - Vestiges of ancient manners and customs, discoverable in modern Italy and Sicily: “This Beffana appears to be heir at law of a certain heathen goddess called Strenia, Who presided over the new-year’s gifts, ‘Strenae,’ from which, indeed, she derived her name. (D. Augustin. De Civit. Dei, lib. Iv. C. q6) Her presents were of the same description as those of the Beffana – figs, dates, and honey. (Ov. Fast. i. 185) Moreover her solemnities were vigorously opposed by the early Christians on account of their noisy, riotous, and licentious character. (Vide Rosini, ed.  Dempster. Lib. i. c. 13, de Dea Strenia.)(VideRosini, ed.  Dempster. Lib. i. c. 13, deDea Strenia.)” 



Comentários

  1. Adorei ler o primeiro capítulo da história de sua família. Já fiquei fã. Obrigada pelos momentos deliciosos. Eunice

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  2. Parece que você estava lá vendo tudo...vc não é o Benjamim button não né ? Kkk muito bom! Parabéns...vai ficar show o blog

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  3. Estou muito orgulhosa de você primo,e emocionada por conhecer a história da nossa família desde o início 😍😍👏👏👏

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